Em uma iniciativa inovadora, a professora de história Natália Fraga de Oliveria da Escola Estadual Floriano Witt, localizada em Minas Gerais, realizou um projeto de extensão com foco na criação e edição de itens do Wikidata, chamado “Wikidata na Escola”. A ação, que ocorreu entre dezembro de 2024 e maio de 2025, teve como objetivo principal combater as lacunas de gênero nas plataformas Wikimedia e enriquecer o Wikidata com dados sobre mulheres pretas brasileiras. A atividade foi conduzida pela docente Natália Fraga e teve como parceria o Projeto Mais Teoria da História na Wiki (Projeto Mais+) que tem como um de seus objetivos ampliar e qualificar a presença de conteúdos sobre grupos minoritários nas platafo…
Em uma iniciativa inovadora, a professora de história Natália Fraga de Oliveria da Escola Estadual Floriano Witt, localizada em Minas Gerais, realizou um projeto de extensão com foco na criação e edição de itens do Wikidata, chamado “Wikidata na Escola”. A ação, que ocorreu entre dezembro de 2024 e maio de 2025, teve como objetivo principal combater as lacunas de gênero nas plataformas Wikimedia e enriquecer o Wikidata com dados sobre mulheres pretas brasileiras. A atividade foi conduzida pela docente Natália Fraga e teve como parceria o Projeto Mais Teoria da História na Wiki (Projeto Mais+) que tem como um de seus objetivos ampliar e qualificar a presença de conteúdos sobre grupos minoritários nas plataformas Wikimedia, incentivando sua comunidade de voluntários a implementarem atividades nesse sentido. O projeto Wikidata na Escola deriva da atividade de conclusão da terceira edição do minicurso Wikipédia em Chave de Gêneros, que Natália participou entre agosto e setembro de 2024.
Uma vivência de produção colaborativa
Sob a orientação da professora, seis estudantes se engajaram na atividade proposta. O projeto de extensão foi estruturado a partir de três oficinas teórico-práticas sobre o ambiente Wikimedia, especificamente a Wikipédia e o Wikidata. No primeiro encontro, a oficina teve a facilitação da professora Natália Fraga e os seguintes de Rafael Ghidini, administrador da Wikipédia em português e integrante do Projeto Mais+. A seleção dos itens a serem inseridos no Wikidata foi realizada a partir do livro “Enciclopédia Negra”, escrito pelo historiador Flávio dos Santos Gomes, pelo artista visual Jaime Lauriano e pela historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz. Os itens foram distribuídos semanalmente pela docente para os alunos.
A parceria entre a professora e o Projeto Mais+ possibilitou uma experiência de aprendizagem mais rica aos alunos, ao possibilitar o contato com plataformas do conhecimento livre e o treinamento técnico para o uso do Wikidata. Durante as oficinas, a atuação da docente foi complementada pelo apoio remoto e voluntário de Rafael Ghidini, que destacou a importância dessa articulação para sanar dúvidas e tornar esses momentos mais dinâmicos e eficazes. Segundo ele, a presença da professora Natália no cotidiano escolar e o suporte oferecido à distância foram decisivos: “enquanto Projeto Mais+, prestei auxílio no sentido de tirar dúvidas e oferecer sugestões. Esse trabalho em conjunto, entre uma docente da escola e uma pessoa do Projeto como suporte, fez com que pudéssemos transformar as oficinas em momentos produtivos e assertivos”, refletiu Rafael.
Desafios da incorporação pedagógica do Wikidata no ensino básico
O perfil dos alunos revelou desafios iniciais, mas também o potencial transformador do projeto Wikidata na Escola. De acordo com o relatório de acompanhamento da disciplina – documento realizado pelo Projeto Mais+ em conjunto com a docente, que buscou documentar e avaliar as etapas do acompanhamento -, todas as pessoas participantes se consideravam novatas nas plataformas Wikimedia, e cinco dos seis estudantes expressaram “dificuldade mediana” em ambientes digitais. Para superar essas barreiras, o Projeto Mais+ ofereceu suporte contínuo através de monitorias semanais via Google Meet e auxílio via WhatsApp, garantindo que estudantes tivessem o apoio necessário para aproveitar a atividade.
A atividade teve como foco a edição e criação de itens de mulheres negras brasileiras no Wikidata. Foram incorporadas ao banco de dados informações sobre líderes religiosas, trabalhadoras rurais e profissionais da saúde, como Iracema de Almeida — médica que dedicou sua carreira ao acolhimento e à luta pelo acesso à educação da população negra. Outras mulheres negras que tiveram seus itens criados no Wikidata foram Hypolita Maria das Dores — mulher negra nascida livre, que foi escravizada e recorreu à justiça para conquistar a própria liberdade e a de seus filhos —, e Esperança Garcia, reconhecida como a primeira advogada brasileira.
A escolha desses nomes buscou valorizar trajetórias pouco lembradas no Wikidata. Mesmo que, em geral, as propriedades do Wikidata não exijam a inserção de fontes, a propriedade referente ao grupo étnico requer obrigatoriamente uma referência. Ainda assim, o esforço de registrar a pertença étnico-racial dessas mulheres na plataforma foi mantido. Em alguns casos, isso foi possível porque o livro utilizado como base — Enciclopédia Negra — indicava que eram mulheres negras. Esse cuidado foi essencial para evitar a perpetuação da invisibilidade dessas vidas, que frequentemente deixam de aparecer em consultas ao banco de dados com recorte racial.
Ao ser questionado sobre os desafios desse tipo de suporte prestado pelo Projeto Mais+ no contexto do ensino básico, o facilitador Rafael Ghidini destacou que esse tipo de acompanhamento exige um contato mais próximo com as pessoas participantes. Isso é uma grande vantagem já que abre margem para outras perspectivas sobre o ensino de História e sobre o potencial pedagógico das plataformas Wikimedia: “Conforme a Profa. Natália foi relacionando o Wikidata com a disciplina de História (abordando a importância da valorização das histórias de mulheres negras), os estudantes puderam observar os problemas de sub-representação trazidos pela Profa. ganhando vida nessa plataforma. E, mais do que isso, puderam agir para solucioná-los, o que eleva o processo de ensino-aprendizagem para outro patamar”, afirmou.
Segundo Rafael, ao longo dos encontros, foi possível perceber o amadurecimento dos estudantes: “tanto é que, ao longo das oficinas, os estudantes começaram a antecipar, através de seu próprio raciocínio, questões que não haviam ainda sido introduzidas, tanto por mim quanto pela Profa., o que evidencia o desenvolvimento da aprendizagem e o potencial de trazer os conhecimentos construídos na escola para os projetos do Movimento Wikimedia.”
Ao final do suporte pedagógico e técnico dado pelo Projeto Mais+, os seis alunos do projeto Wikidata na Escola realizaram edições no Wikidata e ajudaram a criar e melhorar itens que agora estão disponíveis em acesso livre. Em geral, a percepção dos estudantes sobre a participação no projeto Wikidata na Escola foi bastante positiva. Eles destacaram, sobretudo, “a experiência de editar algo que, mais pra frente, pode ser usado como informação para alguém”, e a oportunidade de aprender com pessoas mais experientes.
Quando questionados sobre possíveis melhorias na dinâmica que vivenciaram, alguns participantes apontaram que a carga teórica inicial era densa e sugeriram mais oficinas e aulas práticas para tornar o aprendizado mais dinâmico. Também mencionaram desafios como a conexão à internet da região onde vivem e a dificuldade no formato da entrega final — um relatório científico — gênero textual que não tinham familiaridade.
Embora as atividades do projeto Wikidata na Escola já tenham sido concluídas, os estudantes seguem engajados em divulgar os resultados e refletir sobre a experiência vivida. Como desdobramento desse trabalho, os estudantes Heloísa Neves, Nicoli Rosa e Pedro Mozer, foram classificados para a Feira de Ciências e Inovação Capixaba, e estão na final da Feira Mineira de Iniciação Científica. Nesse vídeo, usado para a inscrição na Feira Mineira, eles compartilham algumas impressões sobre a experiência pedagógica com o Wikidata.
Estimulando a incorporação do Wikidata em sala de aula
O projeto Wikidata na Escola marcou a primeira experiência do Projeto Mais+ no acompanhamento de atividades pedagógicas com o Wikidata e também no ensino básico. Desde 2023, o Projeto Mais+ vem estimulando o uso da plataforma como uma ferramenta de ensino e aprendizagem no ensino superior, buscando integrá-la às práticas pedagógicas e promovendo atividades que incentivam a pesquisa, o pensamento crítico e o desenvolvimento de competências digitais e colaborativas.
Além de permitir o contato direto com o Wikidata, o projeto Wikidata na Escola permitiu que estudantes desenvolvessem habilidades digitais e reflexivas, especialmente no que diz respeito à importância de representar mulheres negras brasileiras em bases de dados estruturados. No formulário de avaliação do suporte prestado pelo Projeto Mais+, os discentes destacaram o entusiasmo ao realizar as edições no banco de dados e a satisfação em contribuir com algo que poderá ser útil para outras pessoas no futuro. Também ressaltaram o ambiente acolhedor proporcionado pelo ministrante, Rafael Ghidini, elogiando a sua paciência, clareza nas explicações e disponibilidade para tirar dúvidas.
Os aprendizados dessa jornada
Alguns estudantes não dispunham de computador em casa, o que exigiu a adaptação das dinâmicas para que as edições também pudessem ser realizadas pelo celular. Essa situação, que reflete a realidade de grande parte da comunidade wikimedista brasileira, evidencia a necessidade de pensar em estratégias formativas específicas para quem utiliza predominantemente o smartphone para editar. O facilitador das oficinas, Rafael Ghidini, explica que essa é uma das principais diferenças entre os projetos com plataformas Wikimedia no ensino básico e aqueles realizados no ensino superior. Segundo ele, além da oferta de oficinas de capacitação, há uma demanda por formações especificamente voltadas ao uso do Wikidata em dispositivos móveis, que considerem as limitações e potencialidades do celular como principal ferramenta de edição. Isso inclui a criação de materiais de apoio — como manuais e tutoriais em vídeo — que orientem passo a passo o processo de edição pelo smartphone, ampliando a autonomia e o engajamento dos estudantes.
Outra reflexão relevante trazida por essa experiência de suporte ao projeto Wikidata na Escola diz respeito aos modos de avaliação dos resultados. Enquanto nos acompanhamentos voltados ao ensino superior o produto final — como a qualidade técnica das edições — tende a receber maior peso, no contexto do ensino básico o foco deve recair sobre o processo formativo em si. As diferenças estruturais entre os dois níveis de ensino exigem critérios de avaliação sensíveis às condições e dinâmicas próprias do ambiente escolar, em que é comum lidar com atividades inacabadas, itens parcialmente configurados ou imagens carregadas de modo incorreto. Como observa Rafael Ghidini, a valorização do percurso de aprendizagem e da apropriação gradual das ferramentas digitais é ainda mais importante que o resultado final.
Por fim, a experiência demonstrou o potencial multiplicador dos acompanhamentos realizados pelo Projeto Mais+, uma vez que foi a partir do suporte oferecido ao projeto de extensão no ensino básico que o facilitador Rafael Ghidini passou a incorporar o uso do Wikidata em suas próprias aulas de Geografia. O impacto do projeto Wikidata na Escola, portanto, vai muito além das edições efetuadas: a integração entre docentes, estudantes e voluntários do Projeto Mais+ mostra que é possível aproximar a escola do universo Wikimedia de maneira estruturada, colaborativa e inspiradora.A professora Natália Fraga reconhece o valor da parceria: *“*Agradeço a todos do projeto Wiki principalmente Dani e Rafa que acompanharam mais de perto a implementação. Foi a minha primeira experiência por aqui e fiquei muito satisfeita com os resultados.” Assim, a iniciativa Wikidata na Escola além de contribuir para a melhoria e diversidade do conhecimento livre, deixa um legado de boas práticas capazes de orientar futuras ações educacionais com o banco de dados.

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